sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Eleições indiretas?


Outra questão interessante julgada pelo STF no mês passado é relativa às eleições indiretas previstas no art. 81, §1º, da CF, em caso de vacância dos cargos de Presidente e Vice-Presidente nos dois últimos anos de governo. Essa regra é a única exceção do Texto Constitucional à eleição direta. O voto direto, aliás, é cláusula pétrea (art. 60, § 4º, II, CF), não podendo ser abolido da Constituição. Esse tema é importante para nós aqui de Rondônia, porque, como se sabe, o TSE irá julgar pedido de cassação do governador, o qual teria praticado abuso do poder econômico nas eleições de 2006. Se acolhido o pedido, a vacância também se dará no fim do mandato. A regra da CF é para vacância dos cargos Presidente e Vice-Presidente da República. E aí? Como deve ser nos estados? O STF resolveu a questão enfrentando caso do estado de Tocantins, depois de o TSE ter julgado dois, da Paraíba e do Maranhão, em que decidiu pela posse do segundo colocado nas eleições. Agora o Supremo definiu que a referida regra da Constituição Federal não é de repetição obrigatória pelas Constituições dos estados-membros. Não se aplica o princípio da simetria, pelo qual regras centrais da Lei Fundamental devem ser repetidas nos âmbitos estadual e muncipal por conta de o Brasil ter adotado a federação como forma de estado. A simetria significa uma relação de correspondência entre normas e princípios da Lei Maior e os diplomas normativos dos demais entes da federação. Uma tentativa de alcançar maior identidade, uniformização, fortalecendo-se o pacto federativo. Mas nesse caso não. Mesmo não sendo obrigatório, a nossa Constituição Estadual reproduz a regra, razão pela qual, se houver a cassação do governador, a eleição será feita pela Assembléia Legislativa. Veja o artigo da CF, o julgado e o dispositivo da Constituição de Rondônia.
CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Art. 81. Vagando os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, far-se-á eleição noventa dias depois de aberta a última vaga.
§ 1º - Ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do período presidencial, a eleição para ambos os cargos será feita trinta dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei.

NOVO: "Por não encontrar razoabilidade jurídica à pretensão, o Tribunal, por maioria, indeferiu pedido de medida cautelar formulado em duas ações diretas ajuizadas pelo Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB em que pleiteada, respectivamente, a declaração de inconstitucionalidade da Lei 2.143/2009, do Estado do Tocantins, que ‘dispõe sobre a eleição, pela Assembléia Legislativa, para Governador e Vice-Governador do Estado do Tocantins, na forma prevista no § 5º do art. 39 da Constituição Estadual’, e contra a Lei 2.154/2009, também do referido Estado-membro, com idêntica ementa. (...) Prevaleceu o voto do Min. Cezar Peluso, relator, que registrou, inicialmente, que, apesar de haver precedente da Corte em hipótese análoga (ADI 1057 MC/BA DJU de 6-4-01), os fundamentos ali expostos deveriam ser relembrados, se não revistos, diante da nova composição da Corte e da exigência de motivação controlável e legítima. Relativamente à questão da necessidade de observância, por parte dos Estados-membros, ante o princípio da simetria, da norma prevista no art. 81, § 1º, da CF, concluiu pelo caráter de não-compulsoriedade do modelo federal. Asseverou não ser lícito, senão contrário à concepção federativa, jungir os Estados-membros, sob o título vinculante da regra da simetria, a normas ou princípios da Constituição Federal cuja inaplicabilidade ou inobservância local não implique contradições teóricas incompatíveis com a coerência sistemática do ordenamento jurídico, com graves dificuldades práticas de qualquer ordem, nem com outra capaz de perturbar o equilíbrio dos poderes ou a unidade nacional. Assim, a regra da simetria não poderia ser produto de uma decisão arbitrária ou imotivada do intérprete. (...) Afirmou que o art. 39, § 5º, da Constituição do Estado do Tocantins (...) reproduziu a provisão da Constituição Federal não por suposta necessidade de reprodução obrigatória, e sim por força de livre decisão jurídico-política do constituinte estadual no exercício da autonomia que lhe é assegurada pela Constituição da República. No que se refere, do ponto de vista da sua gênese, à natureza da lei que predica a Constituição Federal no art. 81, § 1º, bem como a de lei estadual que regulamente previsão idêntica da Constituição estadual, o relator salientou ser indiscutível a competência ratione materiae privativa da União para legislar sobre direito eleitoral (CF, art. 22, I), mas considerou que, quando o constituinte estadual reproduz a regra de eleição indireta pelos representantes do Poder Legislativo, na forma da lei, a lei exigida seria de competência do Estado, por não possuir caráter jurídico-eleitoral. Explicou não se ter, nesse caso, uma lei materialmente eleitoral, haja vista que ela simplesmente regula a sucessão do Chefe do Poder Executivo, sucessão esta extravagante. Reportou-se à orientação firmada na ADI 2.709/SE (DJE de 16-5-08), no sentido da constitucionalidade de norma constitucional estadual que disciplina o processo de escolha de governantes em caso de dupla vacância. Aduziu que, embora não deixem de revelar certa conotação eleitoral, porque dispõem sobre o procedimento de aquisição eletiva do poder político, não haveria como reconhecer ou atribuir características de direito eleitoral stricto sensu às normas que regem a eleição indireta no caso de dupla vacância no último biênio do mandato. Em última instância, essas leis teriam por objeto matéria político-administrativa que demandaria típica decisão do poder geral de autogoverno, inerente à autonomia política dos entes federados. Em suma, a reserva de lei constante do art. 81, § 1º, da CF, nítida e especialíssima exceção ao cânone do exercício direto do sufrágio, diria respeito somente ao regime de dupla vacância dos cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, e, como tal, da óbvia competência da União. Por sua vez, considerados o desenho federativo e a inaplicabilidade do princípio da simetria ao caso, competiria aos Estados-membros a definição e a regulamentação das normas de substituição de Governador e Vice-Governador. De modo que, quando, como na espécie, tivesse o constituinte estadual reproduzido o preceito constitucional federal, a reserva de lei não poderia deixar de se referir à competência do próprio ente federado. (...) No que respeita à questão de saber se a votação, na eleição indireta, deveria ser aberta ou fechada, mencionando que a lei vigente teria adotado a aberta, apontou o relator orientação jurisprudencial que declarara a constitucionalidade do preceito de votação aberta. Frisou, entretanto, que a questão não se resolveria de todo no plano dos aspectos práticos da opção legislativa aqui adotada, qual seja, o voto aberto, por haver, sob tal perspectiva, bons argumentos em favor de ambas as soluções teóricas. Esclareceu que, se a votação secreta subtrai ao eleitor, na condição de representado, a possibilidade de controlar as escolhas dos representantes, facilita-o a votação aberta, sobretudo quando haja suspeita ou risco de acordos obscuros de bastidores. Assinalou que o princípio da publicidade, que é a regra das deliberações parlamentares, também concorre para a idéia de superioridade da votação aberta, sobretudo quando associada ao fato de que o cunho secreto do voto é expediente primacial de tutela do cidadão como eleitor, não de seu representante, cujo dever básico está em dar-lhe conta pública das suas posições no exercício da atividade parlamentar. No entanto, considerou cumprir não subestimar que o voto secreto compõe também o legado de nosso histórico constitucional. Entendeu, porém, que, por guardar a coerência imprescindível à segurança jurídica e à autoridade mesma das decisões da Corte, a solução curial seria a conseqüência retilínea do juízo de inaplicabilidade da regra da simetria e da reafirmação da autonomia política dos Estados-membros na matéria, tocando, ao legislador ordinário estadual, a definição da modalidade da votação." (ADI 4.298-MC e ADI 4.309-MC, Rel. Min. Cezar Peluso, julgamento em 7-10-09, Plenário, Informativo 562).

CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE RONDÔNIA
Art. 60 - Vagando os cargos de Governador e de Vice-Governador do Estado, far-se-á eleição até sessenta dias depois de aberta a última vaga.
§ 1° - Ocorrendo vacância no último ano do período governamental, a eleição para ambos os cargos será feita pela Assembléia Legislativa até quinze dias após aberta a última vaga com aprovação da maioria absoluta de seus membros.
§ 2° - Em qualquer dos casos, os eleitos deverão completar o período de seus antecessores.

3 comentários:

Thonny Hawany disse...

Está aí mais uma questão interessante. Então quer dizer que, possivelmente, teremos eleições indiretas em RO. O direito é bom por isso, quando pensamos que está tudo certo, encontramos outros caminhos que nos levam a noites diferetes. Muito bom texto, professor Fabrício.

Maxsuel Barros Monteiro disse...

Caro Professor.

O TSE mantem o mesmo entendimento? Quem esbelece as regras das eleições Indiretas? Pode o Poder Legislativo estabelecer regras sobre eleições diretas ignorando os requisitos de elegibilidade e inelegibilidade? O cidadão do povo que preencha as condições de elegibilidade ser candidato?

Desculpe-me a enxurrada de questionamentos, mas não poderia perder a oportunidade de sugar um pouco de seus conhecimentos.

Parabéns pelo blog.

Maxsuel

Fabrício Andrade disse...

Olá, Maxsuel. Fiquei muito feliz com o seu contato. Estava lendo seu blog e soube do caso aí da sua cidade. Como você já publicou no blog, de fato, não há como agora, no segundo ano de mandato, após cassação do prefeito, se fazer eleições indiretas. Não há certamente respaldo legal para isso. Só poderia, como eu disse no meu blog, em caso de vacância dos cargos nos dois últimos anos, desde que haja previsão disso na Lei Orgânica, a qual pode também prever eleições diretas. O Legislativo não pode ignorar regras constitucionais de elegibilidade. Ele é obrigado a respeitá-las. O cidadão que preenche os requisitos constitucionais e legais pode sim ser candidato (art. 14, CF, e Lei Complementar 64/90). Um abraço e obrigado pela visita. Fabrício.