quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Cacoal: 32 anos





















No seio da floresta exuberante
Que abrigava segredos seculares
Tu nasceste, pequena e radiante
Aclamada de - Nova Terra
Por povos vindos de terras distantes (...)
E hoje, projetada para a glória
A terra adotou sementes estranhas
E já desfrutas do progresso almejado
Do café és capital!
Já te lançam para a frente da História!
(...)
Às margens de belos rios
Surge a heróica, progressiva Cacoal
No coração do nosso Estado
És a mais bela, és sem igual!
Tu és a nossa amada Cacoal!

Creuci Maria Caetano


No mês de aniversário de Cacoal, em homenagem a ela, vamos fazer uma breve análise da letra do hino de nossa cidade.
Acima temos trechos de hino de Cacoal. A autora da letra é um visionária, porque a sua prospectiva foi perfeita. Veja na letra os trechos destacados. De fato, Cacoal se fez e se faz de povos vindos de terras distantes. A chegada de povos de terras distantes não é fato do passado não. A cada dia muitas pessoas chegam à nossa terra. É impressionante. Estudantes e profissionais liberais de todas as áreas vêm a este eldorado encravado na Amazônia, sempre acolhedor. Isso é facilmente notado nas ruas. E quem chega não quer mais voltar. Há um encantamento por nossa cidade de visitantes e novos moradores, algo sempre exteriorizado. Foi-se o tempo em que todos se conheciam e se cumprimentavam. Hoje, não obstante a nossa característica de cidade do interior, a gente se surpreende com pessoas que não conhecíamos e descobrimos depois que moram aqui há vários anos. Como um prenúncio, a letra da música sempre faz menção a progresso, o que inequivocamente se constata. Cacoal é uma metrópole regional inigualável. É uma terra de pujança e oportunidade. É uma cidade virtuosa. É um centro regional importante de saúde, ensino superior, comércio e culinária, que a todos impressiona. As cidades vizinhas nos visitam o tempo todo. E isso é digno de registro. Ônibus e mais ônibus vão e vêm conduzindo alunos de cursos superiores da Unir, da Unesc e da Facimed. A gastronomia é outra beleza. Temos até um festival gastronômico. Boas opções, bons pratos. Os amigos de outras cidades que o digam. Eles vêm constantemente jantar em Cacoal. E são evidentemente sempre bem-vindos. Como centro de saúde, Cacoal se consolida cada vez mais com hospitais e clínicas existentes e os dois novos hospitais que em breve estarão funcionando plenamente. O aeroporto é outra realidade que se avizinha. Embora sejamos suspeitos, podemos afirmar que Cacoal é a menina dos olhos de Rondônia. É o carro-chefe do progresso do interior do estado. Não é querendo nos gabar não, mas fazer o quê? Nós somos daqui! Parabéns, Cacoal, pelos seus 32 anos, feitos no dia 26/11/2009.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

O mesmo

mesmo (mes.mo)
adj e pron (lat vulg *met ipsimu) 1 Não outro, o próprio. 2 Exatamente igual. 3 Análogo, parecido, semelhante. 4 Que não apresenta mudança; não alterado, invariável. sm 1 A mesma coisa: Conosco aconteceu o mesmo. 2 Aquilo que não importa ou que é indiferente: Chova ou faça sol, para mim é o mesmo. 3 Indivíduo que não apresenta mudança no caráter ou na aparência: Estás sempre o mesmo. 4 Ligando duas orações com o verbo ser, significa simultaneidade: "Era o mesmo ver a um destes e entrar logo em sanha" (Gonçalves Dias, ap Laudelino Freire). adv 1 Exatamente, justamente: Partiu mesmo neste instante. 2 Ainda, até: Mesmo os santos tiveram suas fraquezas. Assim mesmo: ainda assim; entretanto.
Não me considero um especialista em gramática, mas sou bastante criterioso com o que escrevo. Capricho, vou ao dicionário, confiro tudo. Aqui no blog então. Depois do texto pronto e já postado, sempre volto, corrijo ou altero alguma coisa. Confesso que sou até meio viciado em observar os textos, tentar encontrar um errinho, um problema. Gosto muito de procurar erros em placas, faixas etc. A gente vê cada coisa. Indo a Porto Velho outro dia vi uma placa num restaurante que dizia assim: Sobre nova direção. A pessoa podia, pelo menos, ter se lembrado do programa da Rede Globo, né? Parece uma paranóia (não consigo tirar esse acento do ditongo aberto nas paroxítonas). Sempre gostei de língua portuguesa. Fui um bom aluno. Pois é. Algo sempre me intrigou. Vejo ou melhor ouço muita gente usar 'mesmo' como se fosse sujeito de uma frase, pronome pessoal ou demonstrativo. Isso não soa bem. Veja alguns exemplos: cuidado com o cachorro, porque o mesmo pode te morder! Vá buscar os documentos e coloque os mesmos sobre a mesa. Já li ou ouvi alguém dizer que isso não é certo. Como visto acima, o dicionário revela que 'mesmo' é adjetivo ou pronome. E traz exemplos de seu emprego adequado. Encontrei também no sítio http://www.migalhas.com.br/ importante lição sobre o tema, a qual me permito copiar aqui.

Quanto à sintaxe, constitui erro freqüente usar tal pronome demonstrativo sem acompanhamento de substantivo, não se podendo olvidar que mesmo não tem por função substituir ele ou este. Exs.:
a) “O réu foi até à vítima e falou com a mesma” (errado);
b) “Consultou tais autores, e os mesmos lhe indicaram a adequada solução” (errado);
c) “Designada a audiência, compareceram à mesma todos os interessados”.

2) Tais erros se corrigem com facilidade, se há um pouco de atenção;
a) “O réu foi até à vítima e falou com ela”;
b) “Consultou tais autores, e estes lhe indicaram a adequada solução”;
c) “Designada a audiência, compareceram a ela todos os interessados”.

3) Atento à freqüência com que equívocos dessa natureza são cometidos na linguagem forense, observa Edmundo Dantès Nascimento que “mesmo em Português não tem função de pronome pessoal, logo não pode ser empregado por ele, ela, elas, dele, dela, para ele, nele, etc”.

4) E complementa tal autor ser erro crasso dizer:
a) “E falei com a mesma”;
b) “Li o livro e do mesmo tirei ensinamentos”; manda, assim, corrigir tais frases do seguinte modo:
a) “E falei com ela”;
b) “Li o livro e dele tirei ensinamentos”.

5) Com a mesma preocupação de seu emprego equivocado nos textos jurídicos, que hão de submeter-se ao padrão da norma culta, assim adverte Geraldo Amaral Arruda: “O vocábulo mesmo comporta uso em muitas funções gramaticais e não convém que seja usado nos contextos em que seja mais expressivo o emprego de ele ou de este, esse, aquele”.

6) E acrescenta tal autor: “o uso de mesmo em substituição ao pronome pessoal da terceira pessoa ou do demonstrativo este em nada melhora a frase. Antes, a prejudica em clareza e elegância”.

7) Domingos Paschoal Cegalla, por um lado, lança a seguinte advertência: “Evite-se empregar mesmo como substituto de um pronome”.

8) Em seqüência, alinha diversos exemplos de emprego inadequado:
a) “Não suportando mais a dor, procurei o dentista, mas o mesmo tinha viajado”;
b) “Não dê carona a pessoas desconhecidas, porque as mesmas podem ser assaltantes”;
c) “Os donos dos armazéns se obrigaram a estocar e manter os cereais em bom estado, mas os mesmos não respeitaram o contrato”;
d) “O pescador salvou o náufrago e ainda ofereceu ao mesmo a sua cabana”.

9) Por fim, dá-lhes a respectiva correção:
a) “Não suportando mais a dor, procurei o dentista, mas ele tinha viajado”;
b) “Não dê carona a pessoas desconhecidas, porque elas (ou, ainda, a simples supressão de as mesmas) podem ser assaltantes”;
c) “Os donos dos armazéns se obrigaram a estocar e manter os cereais em bom estado, mas eles não respeitaram o contrato”;
d) “O pescador salvou o náufrago e ainda lhe ofereceu a sua cabana”.

10) É tão comum o cometimento desse deslize, que Aires da Mata Machado Filho, após asseverar não haver igualdade entre ele e mesmo, aponta cochilo desse jaez até em Machado de Assis (“Apareceu um relatório contra os mesmos e contra outros”).

11) Também de um gramático do porte de Júlio Nogueira advém o seguinte emprego equivocado desse vocábulo: “Não há, pois, redigir frases em que, sendo ‘tu’ a forma de tratamento, se usem em relação à mesma os possessivos ‘seu’, ‘sua’ e as variações ‘o’, ‘a’, ‘lhe’”.

12) Não escapam desses equívocos até mesmo diplomas legais, como é o caso do art. 6º, d, da Lei 4.380, de 21.8.64, que trata de imóveis adquiridos pelas regras do Sistema Financeiro da Habitação: “Além das prestações mensais referidas na alínea anterior, quando convencionadas prestações intermediárias, fica vedado o reajustamento das mesmas e do saldo devedor a elas correspondentes”.

13) Nesse erro também incide a Lei do Divórcio (Lei 6.515/77), em seu art. 49, ao modificar o art. 7º, § 5º, da Lei de Introdução ao Código Civil (lapso esse que não ocorre no Código Civil, que é de 1916, revisto e discutido, entre outros, por Rui Barbosa e Ernesto Carneiro Ribeiro):
“O estrangeiro casado, que se naturalizar brasileiro, pode, mediante expressa anuência de seu cônjuge, requerer ao juiz, no ato de entrega do decreto de naturalização, se apostile ao mesmo a adoção do regime de comunhão parcial de bens”...

14) Também dessa natureza é o equívoco encontrado no art. 2°, § 1°, da Lei 4.591, de 16.12.64, que dispôs sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias: “O direito à guarda de veículos nas garagens ou locais a isso destinados nas edificações ou conjuntos de edificações será tratado como objeto de propriedade exclusiva, com ressalva das restrições que ao mesmo sejam impostas por instrumentos contratuais adequados, e será vinculada à unidade habitacional a que corresponder”... Melhor é que se diga: “... das restrições que lhe sejam impostas...”

15) Num outro aspecto de significativo interesse, conforme lição de Epifânio Dias, não se há de olvidar que tal vocábulo pode vir, e de modo correto, substantivado no singular, “precedido do artigo definido, equivalendo a mesma coisa: ‘A caridade, pois, não é o mesmo que a filantropia’”.
(...)
17) De tudo o quanto se expôs, vê-se que é incorreto o emprego de o mesmo no art. 1º da Lei 12.722/98 do Município de São Paulo, quando manda afixar o seguinte aviso nas proximidades dos elevadores nos edifícios: “Antes de entrar no elevador, verifique se o mesmo encontra-se parado neste andar”. A correção há de dar-se do seguinte modo: “Antes de entrar no elevador, verifique se ele encontra-se parado neste andar”.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Eleições indiretas?


Outra questão interessante julgada pelo STF no mês passado é relativa às eleições indiretas previstas no art. 81, §1º, da CF, em caso de vacância dos cargos de Presidente e Vice-Presidente nos dois últimos anos de governo. Essa regra é a única exceção do Texto Constitucional à eleição direta. O voto direto, aliás, é cláusula pétrea (art. 60, § 4º, II, CF), não podendo ser abolido da Constituição. Esse tema é importante para nós aqui de Rondônia, porque, como se sabe, o TSE irá julgar pedido de cassação do governador, o qual teria praticado abuso do poder econômico nas eleições de 2006. Se acolhido o pedido, a vacância também se dará no fim do mandato. A regra da CF é para vacância dos cargos Presidente e Vice-Presidente da República. E aí? Como deve ser nos estados? O STF resolveu a questão enfrentando caso do estado de Tocantins, depois de o TSE ter julgado dois, da Paraíba e do Maranhão, em que decidiu pela posse do segundo colocado nas eleições. Agora o Supremo definiu que a referida regra da Constituição Federal não é de repetição obrigatória pelas Constituições dos estados-membros. Não se aplica o princípio da simetria, pelo qual regras centrais da Lei Fundamental devem ser repetidas nos âmbitos estadual e muncipal por conta de o Brasil ter adotado a federação como forma de estado. A simetria significa uma relação de correspondência entre normas e princípios da Lei Maior e os diplomas normativos dos demais entes da federação. Uma tentativa de alcançar maior identidade, uniformização, fortalecendo-se o pacto federativo. Mas nesse caso não. Mesmo não sendo obrigatório, a nossa Constituição Estadual reproduz a regra, razão pela qual, se houver a cassação do governador, a eleição será feita pela Assembléia Legislativa. Veja o artigo da CF, o julgado e o dispositivo da Constituição de Rondônia.
CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Art. 81. Vagando os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, far-se-á eleição noventa dias depois de aberta a última vaga.
§ 1º - Ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do período presidencial, a eleição para ambos os cargos será feita trinta dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei.

NOVO: "Por não encontrar razoabilidade jurídica à pretensão, o Tribunal, por maioria, indeferiu pedido de medida cautelar formulado em duas ações diretas ajuizadas pelo Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB em que pleiteada, respectivamente, a declaração de inconstitucionalidade da Lei 2.143/2009, do Estado do Tocantins, que ‘dispõe sobre a eleição, pela Assembléia Legislativa, para Governador e Vice-Governador do Estado do Tocantins, na forma prevista no § 5º do art. 39 da Constituição Estadual’, e contra a Lei 2.154/2009, também do referido Estado-membro, com idêntica ementa. (...) Prevaleceu o voto do Min. Cezar Peluso, relator, que registrou, inicialmente, que, apesar de haver precedente da Corte em hipótese análoga (ADI 1057 MC/BA DJU de 6-4-01), os fundamentos ali expostos deveriam ser relembrados, se não revistos, diante da nova composição da Corte e da exigência de motivação controlável e legítima. Relativamente à questão da necessidade de observância, por parte dos Estados-membros, ante o princípio da simetria, da norma prevista no art. 81, § 1º, da CF, concluiu pelo caráter de não-compulsoriedade do modelo federal. Asseverou não ser lícito, senão contrário à concepção federativa, jungir os Estados-membros, sob o título vinculante da regra da simetria, a normas ou princípios da Constituição Federal cuja inaplicabilidade ou inobservância local não implique contradições teóricas incompatíveis com a coerência sistemática do ordenamento jurídico, com graves dificuldades práticas de qualquer ordem, nem com outra capaz de perturbar o equilíbrio dos poderes ou a unidade nacional. Assim, a regra da simetria não poderia ser produto de uma decisão arbitrária ou imotivada do intérprete. (...) Afirmou que o art. 39, § 5º, da Constituição do Estado do Tocantins (...) reproduziu a provisão da Constituição Federal não por suposta necessidade de reprodução obrigatória, e sim por força de livre decisão jurídico-política do constituinte estadual no exercício da autonomia que lhe é assegurada pela Constituição da República. No que se refere, do ponto de vista da sua gênese, à natureza da lei que predica a Constituição Federal no art. 81, § 1º, bem como a de lei estadual que regulamente previsão idêntica da Constituição estadual, o relator salientou ser indiscutível a competência ratione materiae privativa da União para legislar sobre direito eleitoral (CF, art. 22, I), mas considerou que, quando o constituinte estadual reproduz a regra de eleição indireta pelos representantes do Poder Legislativo, na forma da lei, a lei exigida seria de competência do Estado, por não possuir caráter jurídico-eleitoral. Explicou não se ter, nesse caso, uma lei materialmente eleitoral, haja vista que ela simplesmente regula a sucessão do Chefe do Poder Executivo, sucessão esta extravagante. Reportou-se à orientação firmada na ADI 2.709/SE (DJE de 16-5-08), no sentido da constitucionalidade de norma constitucional estadual que disciplina o processo de escolha de governantes em caso de dupla vacância. Aduziu que, embora não deixem de revelar certa conotação eleitoral, porque dispõem sobre o procedimento de aquisição eletiva do poder político, não haveria como reconhecer ou atribuir características de direito eleitoral stricto sensu às normas que regem a eleição indireta no caso de dupla vacância no último biênio do mandato. Em última instância, essas leis teriam por objeto matéria político-administrativa que demandaria típica decisão do poder geral de autogoverno, inerente à autonomia política dos entes federados. Em suma, a reserva de lei constante do art. 81, § 1º, da CF, nítida e especialíssima exceção ao cânone do exercício direto do sufrágio, diria respeito somente ao regime de dupla vacância dos cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, e, como tal, da óbvia competência da União. Por sua vez, considerados o desenho federativo e a inaplicabilidade do princípio da simetria ao caso, competiria aos Estados-membros a definição e a regulamentação das normas de substituição de Governador e Vice-Governador. De modo que, quando, como na espécie, tivesse o constituinte estadual reproduzido o preceito constitucional federal, a reserva de lei não poderia deixar de se referir à competência do próprio ente federado. (...) No que respeita à questão de saber se a votação, na eleição indireta, deveria ser aberta ou fechada, mencionando que a lei vigente teria adotado a aberta, apontou o relator orientação jurisprudencial que declarara a constitucionalidade do preceito de votação aberta. Frisou, entretanto, que a questão não se resolveria de todo no plano dos aspectos práticos da opção legislativa aqui adotada, qual seja, o voto aberto, por haver, sob tal perspectiva, bons argumentos em favor de ambas as soluções teóricas. Esclareceu que, se a votação secreta subtrai ao eleitor, na condição de representado, a possibilidade de controlar as escolhas dos representantes, facilita-o a votação aberta, sobretudo quando haja suspeita ou risco de acordos obscuros de bastidores. Assinalou que o princípio da publicidade, que é a regra das deliberações parlamentares, também concorre para a idéia de superioridade da votação aberta, sobretudo quando associada ao fato de que o cunho secreto do voto é expediente primacial de tutela do cidadão como eleitor, não de seu representante, cujo dever básico está em dar-lhe conta pública das suas posições no exercício da atividade parlamentar. No entanto, considerou cumprir não subestimar que o voto secreto compõe também o legado de nosso histórico constitucional. Entendeu, porém, que, por guardar a coerência imprescindível à segurança jurídica e à autoridade mesma das decisões da Corte, a solução curial seria a conseqüência retilínea do juízo de inaplicabilidade da regra da simetria e da reafirmação da autonomia política dos Estados-membros na matéria, tocando, ao legislador ordinário estadual, a definição da modalidade da votação." (ADI 4.298-MC e ADI 4.309-MC, Rel. Min. Cezar Peluso, julgamento em 7-10-09, Plenário, Informativo 562).

CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE RONDÔNIA
Art. 60 - Vagando os cargos de Governador e de Vice-Governador do Estado, far-se-á eleição até sessenta dias depois de aberta a última vaga.
§ 1° - Ocorrendo vacância no último ano do período governamental, a eleição para ambos os cargos será feita pela Assembléia Legislativa até quinze dias após aberta a última vaga com aprovação da maioria absoluta de seus membros.
§ 2° - Em qualquer dos casos, os eleitos deverão completar o período de seus antecessores.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

O Poder de investigação criminal do Ministério Público



Meu amigo Rômulo sugeriu que eu colocasse no blog e comentasse decisões importantes proferidas pelo STF. Achei a dica muito bacana. Lá vai a primeira. Há poucos dias a segunda turma do STF, por meio do Min. Celso de Mello, entendeu que o Ministério Público possui poder de investigação criminal. Este tema é controvertido, mas parece sinalizar a jurisprudência no sentido de não haver empecilho constitucional.
Quem defende a impossibilidade da investigação criminal sustenta que o MP não é parte e deve adotar uma postura isenta e imparcial, alegando que, caso o Parquet possa investigar, sua conduta na ação penal estará contaminada, viciada, de modo que, tendo investigado, perseguirá uma condenação a todo custo. Ademais, entende essa corrente que a atividade de investigação criminal é exclusiva das polícias judiciárias. Por outro lado, os que defendem a possibilidade da investigação afirmam que o MP é o destinatário das provas produzidas pela polícia. Alegam que o Ministério Público realiza o controle externo da atividade policial e é o titular da ação penal pública. Sustentam ainda que o inquérito policial é dispensável para a propositura da ação penal e que a atividade investigatória não é uma exclusividade das polícias. Entendo como acertada a decisão do STF. Veja a ementa do voto do ministro Celso de Mello.


HABEAS CORPUS 89.837 DISTRITO FEDERAL
RELATOR : MIN. CELSO DE MELLO
PACTE.(S) : EMANOEL LOUREIRO FERREIRA
IMPTE.(S) : JASON BARBOSA DE FARIA E OUTRO(A/S)
COATOR(A/S)(ES) : PRESIDENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
- O inquérito policial qualifica-se como procedimento administrativo, de caráter pré-processual, ordinariamente vocacionado a subsidiar, nos casos de infrações perseguíveis mediante ação penal de iniciativa pública, a atuação persecutória do Ministério Público, que é o verdadeiro destinatário dos elementos que compõem a “informatio delicti”. Precedentes.
- A investigação penal, quando realizada por organismos policiais, será sempre dirigida por autoridade policial, a quem igualmente competirá exercer, com exclusividade, a presidência do respectivo inquérito.
- A outorga constitucional de funções de polícia judiciária à instituição policial não impede nem exclui a possibilidade de o Ministério Público, que é o “dominus litis”, determinar a abertura de inquéritos policiais, requisitar esclarecimentos e diligências investigatórias, estar presente e acompanhar, junto a órgãos e agentes policiais, quaisquer atos de investigação penal, mesmo aqueles sob regime de sigilo, sem prejuízo de outras medidas que lhe pareçam indispensáveis à formação da sua “opinio delicti”, sendo-lhe vedado, no entanto, assumir a presidência do inquérito policial, que traduz atribuição privativa da autoridade policial. Precedentes.
A ACUSAÇÃO PENAL, PARA SER FORMULADA, NÃO DEPENDE, NECESSARIAMENTE, DE PRÉVIA INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO POLICIAL.
- Ainda que inexista qualquer investigação penal promovida pela Polícia Judiciária, o Ministério Público, mesmo assim, pode fazer instaurar, validamente, a pertinente “persecutio criminis in judicio”, desde que disponha, para tanto, de elementos mínimos de informação, fundados em base empírica idônea, que o habilitem a deduzir, perante juízes e Tribunais, a acusação penal. Doutrina. Precedentes.
A QUESTÃO DA CLÁUSULA CONSTITUCIONAL DE EXCLUSIVIDADE E A ATIVIDADE INVESTIGATÓRIA.
- A cláusula de exclusividade inscrita no art. 144, § 1º, inciso IV, da Constituição da República - que não inibe a atividade de investigação criminal do Ministério Público - tem por única finalidade conferir à Polícia Federal, dentre os diversos organismos policiais que compõem o aparato repressivo da União Federal (polícia federal, polícia rodoviária federal e polícia ferroviária federal), primazia investigatória na apuração dos crimes previstos no próprio texto da Lei Fundamental ou, ainda, em tratados ou convenções internacionais.
- Incumbe, à Polícia Civil dos Estados-membros e do Distrito Federal, ressalvada a competência da União Federal e excetuada a apuração dos crimes militares, a função de proceder à investigação dos ilícitos penais (crimes e contravenções), sem prejuízo do poder investigatório de que dispõe, como atividade
subsidiária, o Ministério Público.
- Função de polícia judiciária e função de investigação penal: uma distinção conceitual relevante, que também justifica o reconhecimento, ao Ministério Público, do poder investigatório em matéria penal. Doutrina.
É PLENA A LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO PODER DE INVESTIGAR DO MINISTÉRIO PÚBLICO, POIS OS ORGANISMOS POLICIAIS (EMBORA DETENTORES DA FUNÇÃO DE POLÍCIA JUDICIÁRIA) NÃO TÊM, NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO, O MONOPÓLIO DA COMPETÊNCIA PENAL INVESTIGATÓRIA.
- O poder de investigar compõe, em sede penal, o complexo de funções institucionais do Ministério Público, que dispõe, na condição de “dominus litis” e, também, como expressão de sua competência para exercer o controle externo da atividade policial, da atribuição de fazer instaurar, ainda que em caráter subsidiário, mas por autoridade própria e sob sua direção, procedimentos de investigação penal destinados a viabilizar a obtenção de dados informativos, de subsídios probatórios e de elementos de convicção que lhe permitam formar a “opinio delicti”, em ordem a propiciar eventual ajuizamento da ação penal de iniciativa pública. Doutrina. Precedentes.
CONTROLE JURISDICIONAL DA ATIVIDADE INVESTIGATÓRIA DOS MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO: OPONIBILIDADE, A ESTES, DO SISTEMA DE DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS, QUANDO EXERCIDO, PELO “PARQUET”, O PODER DE INVESTIGAÇÃO PENAL.
- O Ministério Público, sem prejuízo da fiscalização intra- -orgânica e daquela desempenhada pelo Conselho Nacional do Ministério Público, está permanentemente sujeito ao controle jurisdicional dos atos que pratique no âmbito das investigações penais que promova “ex propria auctoritate”, não podendo, dentre outras limitações de ordem jurídica, desrespeitar o direito do investigado ao silêncio (“nemo tenetur se detegere”), nem lhe ordenar a condução coercitiva, nem constrangê-lo a produzir prova contra si próprio, nem lhe recusar o conhecimento das razões motivadoras do procedimento investigatório, nem submetê-lo a medidas sujeitas à reserva constitucional de jurisdição, nem impedi-lo de fazer-se acompanhar de Advogado, nem impor, a este, indevidas restrições ao regular desempenho de suas prerrogativas profissionais (Lei nº 8.906/94, art. 7º, v.g.).
- O procedimento investigatório instaurado pelo Ministério Público deverá conter todas as peças, termos de declarações ou depoimentos, laudos periciais e demais subsídios probatórios
coligidos no curso da investigação, não podendo, o “Parquet”, sonegar, selecionar ou deixar de juntar, aos autos, quaisquer desses elementos de informação, cujo conteúdo, por referir-se ao objeto da apuração penal, deve ser tornado acessível tanto à pessoa sob investigação quanto ao seu Advogado.
- O regime de sigilo, sempre excepcional, eventualmente prevalecente no contexto de investigação penal promovida pelo Ministério Público, não se revelará oponível ao investigado e ao Advogado por este constituído, que terão direito de acesso – considerado o princípio da comunhão das provas – a todos os elementos de informação que já tenham sido formalmente incorporados aos autos do respectivo procedimento investigatório.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

A Teoria das Maçãs


Eu sou apaixonado por esse texto do juiz federal George Marmelstein Lima (http://www.direitosfundamentais.net/). Nem preciso mais falar quem é ele, porque faço isso o tempo todo. Sou fã declarado. Nesse texto ele faz uma analogia maravilhosa entre a colheita de maçãs e o Pós-Positivismo, movimento que rompeu com o Positivismo e promoveu uma aproximação entre o Direito e a Ética por meio da Filosofia Jurídica, reconhecendo-se a força normativa da Constituição, dos seus princípios, bem como a exigência de conteúdo ético aos textos normativos. A Lei Fundamental tomou definitivamente o centro e o topo do sistema normativo, posição que era antes ocupada pelo Código Civil. Todo o direito infranconstitucional passa, nesse contexto, por um releitura, por uma filtragem constitucional. Enfim, o Direito, inclusive o privado, está constitucionalizado. Ontem, ao ver a prova do ENADE, percebi que o perfil das provas mudou. Há uma evidente libertação das provas que sempre pediam o texto seco de lei ou da Constituição. Parece que chegamos a um momento em que as provas serão mais críticas, mais pós-positivistas. Graças a Deus. Gosto tanto desse artigo que sempre o ultilizo nos cursos de Pós-Graduação que ministro. Vamos então a ele.



Para Kelsen, o papel do cientista do direito (jurista) é colher as maçãs que estão na árvore e estão prontas para consumo, colocando-as em um caixote. O critério dessa seleção deve ser totalmente técnico-científico: o colhedor analisa aquelas maçãs que podem ser consumidas e ponto final. Não cabe a ele discutir o sabor da fruta. As frutas mais ácidas e as mais amargas, desde que estejam prontas para consumo, podem ser colocadas no caixote.
Não cabe ao jurista se preocupar com a plantação da árvore, nem como a fase de adubação, de poda, enfim. O papel do jurista, como se disse, limita-se a colocar as frutas na caixa. Todo o resto do processo não interessa à ciência do direito.
Nesse processo, o juiz tem um papel diferente. O juiz deverá escolher, entre aquelas maçãs que foram previamente colocadas no caixote pelos juristas, aquela que será de fato consumida. A escolha do juiz é, de certo modo, arbitrária, no sentido de não ser possível verificar os critérios racionais utilizados pelo juiz para fazer aquela escolha. É um ato de vontade, que não interessa ao jurista.
Um ponto básico para compreensão dessa teoria (pura) das maçãs é que o sabor da fruta não deve ser levado em conta nem pelo jurista nem pelo juiz. Se a maçã estiver pronta pra consumo, deve ser consumida sem questionamentos.
A Teoria das Maças sob a ótica do pós-positivismo
Com o pós-positivismo, o consumidor das maçãs se tornou mais exigente, pois, em algumas situações, foram oferecidas maçãs muito amargas, que deixaram muitas pessoas com fome ou passando mal, já que não conseguiram comer uma fruta tão ruim. Por isso, resolveu-se submeter as maçãs a um controle de qualidade mais rígido. Somente as maçãs que passassem por esse teste de qualidade poderiam ser colocadas no caixote. Esse teste de qualidade incluiu um padrão de sabor: somente aquelas frutas mais saborosas deveriam ser selecionadas. Na teoria jurídica, esse padrão de qualidade é ditado pelos direitos fundamentais.
O papel do jurista também se transforma substancialmente. Percebeu-se que aquele que vai colher as frutas na árvore e colocá-las no caixote também é, no final das contas, consumidor. Logo, é natural que ele seja tendencioso nessa escolha para colocar no caixote apenas aquelas maçãs que, segundo o seu gosto pessoal, sejam saborosas. E aqui a Comissão de Qualidade Total, aquela mesma que impôs um critério de qualidade para que as frutas amargas e ácidas não sejam consumidas, exige um relatório substancioso daquele que colhe as maçãs para que ele diga quais foram os critérios que utilizou para selecionar as frutas.
As frutas estão mesmo adequadas para serem consumidas? As frutas já estão amadurecidas o suficiente? As frutas possuem os nutrientes necessários e indispensáveis para satisfazer o consumidor? Esse novo agrotóxico utilizado não poderá causar danos à saúde das pessoas? E assim por diante... No direito, esses critérios são conhecidos como "princípio da proporcionalidade".
O mesmo relatório é exigido do juiz, ou seja, daquele vai retirar as frutas da caixa para oferecer ao consumidor. Além de ter que justificar objetivamente a sua escolha, o juiz terá que ouvir a opinião dos consumidores antes de tomar uma decisão. Vai ouvir também nutricionistas, agrônomos, médicos, que lhe darão um suporte técnico para que a decisão seja a mais correta possível. Muitos defendem que o juiz pode escolher, inclusive, outras maçãs além daquelas que foram colocadas no caixote, mas nem todos pensam assim.
Durante todo esse processo, que vai desde a plantação da árvore até o consumo das maçãs, o consumidor é uma peça-chave. É ele quem vai escolher o adubo, o tipo do maçã, o tamanho das maçãs, enfim, cabe a ele as escolhas mais importantes. E como o jurista e o juiz ao mesmo tempo são consumidores (!) também eles participam desse processo...
A grande dificuldade nessa nova técnica de produção é definir os critérios objetivos para tornar o controle de qualidade mais claro e menos subjetivo. Os gostos pessoais não são uniformes. Por isso, há muita controvérsia sobre quem deve dizer o que passa e o que não passa pelo controle de qualidade. Em regra, a opinião da maioria dos consumidores deve prevalecer. No entanto, essa vontade não pode ser exercida ao ponto de prejudicar aqueles consumidores minoritários que possuem gostos diferentes. Ainda não se sabe quem deve proteger esses consumidores que estão em minoria. Por enquanto, essa questão ainda não foi totalmente definida pelo pós-positivismo, embora exista uma tendência de se permitir aos juízes (re)fazerem essa escolha, desde que justifiquem racionalmente a sua decisão. Ou seja, o controle de qualidade não é um momento único dentro do processo. Todos devem exercer esse controle, desde aquele que planta a árvore, passando por aquele que colhe as frutas, passando por aquele que escolhe a maçã para o consumo, chegando finalmente ao consumidor, que deve reclamar quando a maçã não estiver tão saborosa quanto ele merece.

Eis, em síntese, a teoria das maçãs...

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

O Caso Expedito Junior



Todo mundo está acompanhando esse verdadeiro imbróglio jurídico envolvendo o Senador Expedito Junior. Como se sabe, o senador foi cassado pela Justiça Eleitoral por ter obtido seus votos abusando do poder econômico, o que é vedado pela Lei 9.504/97 (Lei Geral das Eleições). Veja:

"Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990. (Incluído pela Lei nº 9.840, de 28.9.1999)"
Sobre a constitucionalidade dessa norma o TSE tem jurisprudência assentada. E o mais importante: o entendimento predominante é de que o afastamento de quem praticou a captação ilícita de sufrágio é imediato.

"(...) I - É constitucional e tem aplicação imediata o art. 41-A da Lei das Eleições, de acordo com entendimento consagrado no TSE (REspe no 25.215/RN, rel. Min. Caputo Bastos, julgado em 4.8.2005, publicado no DJ de 9.9.2005). (...)"
(Ac. no 25.295, de 20.9.2005, rel. Min. Cesar Asfor Rocha.)
"Agravo de instrumento provido. Eleição 2000. Recurso especial. Ação de impugnação de mandato eletivo. (...)" NE: A jurisprudência do TSE está consolidada no sentido da constitucionalidade do art. 41-A da Lei no 9.504/97, que não estabelece hipótese de inelegibilidade e possibilita a imediata cassação do registro ou do diploma. (Ac. no 4.659, de 19.8.2004, rel. Min. Peçanha Martins.)

"(...) III - A jurisprudência da Corte está consolidada quanto à constitucionalidade do art. 41-A da Lei no 9.504/97, que não estabelece hipótese de inelegibilidade e possibilita a imediata cassação de registro ou diploma (precedentes-TSE). (...)"(Ac. no 612, de 29.4.2004, rel. Min. Carlos Velloso.)

A jurisprudência do STF também é no sentido de que são imediatos os efeitos da cassação. Acompanhe o entendimento do Supremo.

(...) No caso, comunicada a suspensão dos direitos políticos do litisconsorte passivo por decisão judicial e solicitada a adoção de providências para a execução do julgado, de acordo com determinação do Superior Tribunal de Justiça, não cabia outra conduta à autoridade coatora senão declarar a perda do mandato do parlamentar." (MS 25.461, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 29-6-06, DJ de 22-9-06)

"Mandado de segurança. Suplente de Deputado Federal. Impetração contra omissão da Presidência da Câmara dos Deputados. (...) Eficácia imediata das decisões da Justiça Eleitoral, salvo exceções previstas em lei. Comunicada a decisão à Presidência da Câmara dos Deputados, cabe a esta dar posse imediata ao suplente do parlamentar que teve seu diploma cassado. Segurança concedida." (MS 25.458, Rel. p/ o ac. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 7-12-05, DJ de 9-3-07)
A relutância da Mesa Diretora do Senado em cumprir a decisão do TSE e do STF (MS impetrado por Acir Gurgacz contra o ato do Senado) tem rendido inúmeras e contundentes críticas à postura dos Senadores. Entretanto, há uma regra na Constituição que está me deixando intrigado, que segue transcrita abaixo.
"Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:
V - quando o decretar a Justiça Eleitoral, nos casos previstos nesta Constituição;

§ 3º - Nos casos previstos nos incisos III a V, a perda será declarada pela Mesa da Casa respectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa."
É muito curiosa essa norma constitucional, porque ela parece sugerir que, não obstante uma cassação transitada em julgado, ainda se deve ouvir, na Casa Legislativa, o parlamentar cassado.
Diante dessa regra constitucional, sobre a qual não encontrei posição do STF, será que é tão absurdo o comportamento do Senado Federal nesse caso envolvendo o senador de Rondônia? Eu gostaria que um ministro do STF interpretasse esse dispositivo, de modo a elucidar definitivamente tudo isso. Talvez absurda seja a norma constitucional, uma vez que permite, após a decisão judicial, ainda manifestação do indivíduo cassado.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Resposta à carta de um velho tio

A exemplo do que faz o meu amigo William Gama, adotarei aqui no blog o espaço denominado "Nepotismo", no qual publicarei textos de parentes. Hoje, um do meu irmão. Trata-se de um crônica muito interessante sobre a Justiça brasileira. Boa leitura!
Por Flávio da Silva Andrade*
Não faz muito tempo, recebi uma carta de meu velho tio que mora no Estado de São Paulo. Dentre as felicitações e manifestações de saudades que nos dirigiu, disse que sempre admirou Rui Barbosa, ao seu ver um dos maiores expoentes do Direito Brasileiro, mas que atualmente não acreditava mais no Poder Judiciário em razão de sua crítica lentidão e de sua incapacidade de combater efetivamente a corrupção e fazer diminuir a impunidade no país. Em resposta, sem querer lhe tirar totalmente a razão, expus meu ponto de vista sobre o assunto: “Prezado tio, foi com felicidade e satisfação que recebi sua carta. Pude aprender um pouco mais graças a seus conhecimentos e cultura hauridos ao longo dos anos. Fico alegre em saber de seu interesse pelo mundo jurídico, especialmente pelo jurista, jornalista, político e orador Rui Barbosa. Realmente, ele foi cognominado “Águia de Haia”, por sua brilhante atuação como representante do Brasil na 2ª Conferência de Paz, realizada em Haia, na Holanda, em 1907. Ali ele se revelou um grande defensor das idéias liberais, tendo realizado discursos históricos, até hoje lembrados, principalmente no meio jurídico.
Para ilustrar a cultura do saudoso baiano Rui Barbosa, conta-se que, certa feita, ao chegar em casa, ouviu um barulho estranho vindo do seu quintal. Chegando lá, constatou haver um ladrão tentando levar seus patos de criação. Aproximou-se vagarosamente do indivíduo e, surpreendendo-o ao tentar pular o muro com seus amados patos, disse-lhe:

-Oh! bucéfalo anácrono! Não o interpelo pelo valor intrínseco dos bípedes palmípedes, mas sim pelo ato vil e sorrateiro de profanares o recôndito da minha habitação, levando meus ovíparos à sorrelfa e à socapa. Se fazes isso por necessidade, transijo; mas é para zombares da minha elevada prosopopéia de cidadão, dar-te-ei com minha bengala fosfórica bem no alto da tua sinagoga, e o farei com tal ímpeto que te reduzirei à quinquagésima potência que o vulgo denomina nada.
E o ladrão confuso, coça a cabeça e diz:
- Doutor, eu levo ou deixo os patos?

Quanto à morosidade da justiça brasileira, você está coberto de razão. É fato que vem surgindo um alento com a criação dos Juizados Especiais Federais e também com os Juizados Virtuais, mas o problema é que a Constituição Federal de 1988 abriu as portas do Poder Judiciário, facilitando o acesso à Justiça, mas até aqui não se conseguiu encontrar, satisfatoriamente, a porta de saída! Apesar de se ter incluído no Texto Constitucional o princípio da razoável duração do processo, a maioria dos processos ainda tramita por muitos anos até a solução definitiva. Se não obtida uma liminar, a parte cujo direito foi violado pode acabar prejudicada em função do prolongado trâmite do processo.
Nossa legislação processual (civil e penal) revela-se arcaica. Nosso Código Penal, como você bem lembrou, é da década de 40. Também o Código de Processo Penal é de 1942. Nosso Código Civil era de 1916 e só recentemente foi substituído. Já o Código de Processo Civil é de 73, sendo que está ultrapassado para cuidar dos modernos conflitos de interesse que chegam, em números alarmantes, às Cortes de Justiça.
Além desse aspecto de caráter legislativo, há a possibilidade de uma série interminável de recursos. Muitas causas vão até o Supremo Tribunal Federal, apesar de que o Pretório Excelso só deveria cuidar de casos de repercussão geral e de sua competência originária (somente questões relevantes relativas à Constituição Federal). Só agora, recentemente, é que foram aprovadas as leis que regulamentaram as chamadas súmulas vinculantes e também o regramento para os recursos repetidos, o que deverá encurtar o tempo de tramitação dos processos.
Vale realçar também que, mesmo de modo vagaroso (culpa do Poder Legislativo Federal), estão sendo reformados os citados códigos, medida que deverá tornar mais célere o andamento dos processos, especialmente porque finalmente foi editada a Lei nº 11.419/2006, que cuida do chamado processo eletrônico. Isso já é realidade na Justiça Federal e em vários Tribunais Estaduais. Na Vara Federal em que trabalhei até o ano passado, por exemplo, mais de 96 % dos processos são digitais (justiça sem papel). Acontece que essa nova sistemática só se tornará mais concreta e ampla no país caso haja um maciço investimento estatal em tecnologia da informação juntos aos tribunais. Também há a necessidade de se reforçar o repasse orçamentário do Poder Judiciário, permitindo-se a contratação de mais servidores, a instalação de novas varas e a realização de treinamentos e cursos de aperfeiçoamento. Nesse ponto, há de se contar com a sensibilidade e o bom senso do Poder Executivo e também do Parlamento.
No campo penal, a situação se mostra mais crítica. O crime organizado já está na era cibernética e atuando em várias frentes, avançando cada vez mais, ultrapassando todos os limites. O Congresso Nacional, por sua vez, só sinaliza para um aperfeiçoamento das leis ou recrudescimento normativo graças às pressões da imprensa e da população indefesa, à medida que se tem notícia de um grave crime, como aquele de que foi vítima o pobre menino carioca João Hélio. Aguardemos, pois, o próximo pacote legislativo, sabendo que há o risco de inocuidade, já que a questão se revela mais séria e tem contornos sociais, passando, ademais, pela necessidade premente de melhor aparelhamento das polícias e fiscalização efetiva das fronteiras pátrias.
No atual contexto, a verdade é que, no aspecto criminal e no que diz respeito ao combate à improbidade administrativa (corrupção na administração pública) e às infrações eleitorais, não tem havido efetividade nas investigações e celeridade nos julgamentos, criando-se ambiente propício para a impunidade. Note-se que não se pode confundir polícia com justiça. O Poder Judiciário só pode julgar aquilo que chega às suas mãos, mas acontece que, como dito, as polícias civis e militares, em muitos Estados, estão desestruturadas e às vezes, lamentavelmente, sofrem ingerência política. A Polícia Federal, com o apoio recebido do Governo Federal, vem fazendo um bom trabalho, avançando em investigações e cumprindo uma série de mandados de prisão e de busca e apreensão, expedidos pela Justiça Federal em todo o país. Isso já é um alento. A única crítica é no sentido de ser desnecessário o espetáculo midiático quando das prisões e do cumprimento dos mandados de busca. Não se pode esquecer que o preso perde a liberdade, mas mantém o direito à imagem, à intimidade e à vida privada. Como conseqüência disso, o Supremo Tribunal Federal editou Súmula Vinculante nº 11, segundo a qual “só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros”.
Por outro lado, penso que devemos lutar para mudar o quadro de corrupção e impunidade que torna o Brasil conhecido no mundo. O inteligente Jô Soares, tratando do assunto, lembrou que “a corrupção não é uma invenção brasileira, mas a impunidade é uma coisa nossa”.
De fato, essa é uma realidade que precisa ser transformada. As instituições competentes devem, a bem da sociedade, tentar converter em condenações as denúncias fundadas em provas, respeitadas as garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório. Ajudaria muito se os Tribunais Superiores, integrados por ministros nomeados, passassem, sem perder o equilíbrio e a prudência, a ter uma visão mais enérgica quando da aplicação da lei, como o é nas instâncias de 1º grau e nos Estados Unidos da América, por exemplo. No Brasil, os ministros ficam distantes dos acontecimentos, tornando-se às vezes dissociados da realidade de uma sociedade que se vê acuada e que clama por Justiça. No ano passado, a então Presidente do Supremo e o Ministro Gilmar Mendes foram assaltados no Rio! Sentiram na pele o que a população está sofrendo...
O povo não mais se conforma calado com atos criminosos e de corrupção. Não se pode mais admitir uma sociedade marcada pela violência aguda, por políticos e funcionários corruptos, pelas desigualdades sociais e pela pobreza. Para que as gerações futuras possam viver em um país digno e honrado, impõe-se que, sem prejuízo do investimento em educação e saúde, seja a lei aplicada com mais rigor, de maneira a desencorajar o avanço da criminalidade, especialmente no que tange aos delitos contra a administração pública, permitindo-se, quem sabe, em futuro próximo, governos mais honestos e justos, de modo que possamos ter uma sociedade mais igualitária e, quiçá, mais feliz.
Por fim, voltando ao jurista da sua predileção, Rui Barbosa, um dos maiores combatentes da corrupção, vale lembrar trecho de importante discurso em que disse: “De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, e rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto”.
Ainda que tenha razão o renomado jurisconsulto e orador, não podemos esmorecer, de modo que, com sacrifícios e esperanças, devemos continuar travando batalhas e fazendo esforços em nome do ideal de Justiça, aplicando a lei como manda a Constituição da República e da maneira que espera a sociedade.
Espero que tenha assistido à minissérie MAD MARIA e também, por último, ao seriado AMAZÔNIA, os quais bem retrataram a história dos Estados de Rondônia e Acre, respectivamente. Por tais obras se pode ter uma noção de como foi a saga do povo que aqui se instalou no final do século XIX e início do século XX. É verdade que a história acreana, com a revolução, é bem mais atraente que a da terra do Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon, o que, entretanto, não diminui a grandeza do Estado da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré.
Fraternal abraço, acompanhado de votos de consideração e apreço”.

* O autor é Juiz Federal em Rondônia