terça-feira, 30 de março de 2010

Por que ativismo judicial?



















Alguns alunos pediram para eu escrever algo sobre 'Ativismo Judicial', tema da moda no mundo jurídico. Vou escrever poucas linhas para apresentar uma introdução ao assunto, haja vista que é fácil encontrar aqui no mundo virtual excelentes textos sobre tão interessante matéria. Sugiro, aliás, textos do constitucionalista Luís Roberto Barroso. Procura rápida e fácil no imprescindível http://www.google.com.br/ permite econtrar excelentes trabalhos acerca do tema.
Bem. Sabe-se que, durante a fase chamada Positivismo, o papel dos juízes era simplesmente o de reproduzir no caso concreto a vontade do legislador. O juiz era chamado nesse período de 'boca da lei'. Não desenvolvia uma atividade criativa, apenas aplicava friamente o comando normativo abstrato ao caso concreto. Era como se sempre houvesse uma resposta legislativa para todos os problemas surgidos no mundo real, o que nunca foi uma verdade. Nessa fase, aliás, por intermédio da lei, se podia e se fazia de tudo. Cometeram-se atrocidades de toda sorte, como já lembrei aqui no texto intitulado 'Neoconstitucionalismo'. Especialmente a partir da segunda grande guerra, reconhecidos os abusos que o estado sempre comete, desenvolveu-se um movimento pelo qual se reconheceu valor normativo às Constituições, as quais antes disso sempre tiveram apenas uma caráter político ou ideológico. Não tinham ou não lhes era reconhecida uma força normativa. Os princípios constitucionais eram somente orientações a legisladores e administradores. A bandeira do Pós-Positivismo - de ruptura com o modelo do positivismo clássico - ganha enorme importância, notadamente pelo valor dado aos direitos fundamentais consagrados nos Textos Constitucionais. Trata-se de princípios que limitam o poder do Estado e protegem os cidadãos contra a opressão geralmente cometida por aqueles que detêm o poder. Nesse mesmo contexto, foram consagrados nas Constituições valores outros, como os direitos sociais - saúde, educação, segurança, lazer, moradia. Estes, para serem efetivados, demandam uma prestação positiva do Poder Público, por meio de leis e comportamento do Poder Executivo. Há quem entenda que os direitos sociais são normas programáticas, normas de eficácia limitada, ou seja, para terem completa efetividade, dependem sempre da atuação do legislador e dos governantes. O neoconstitucionalismo suscita as seguintes perguntas: Mas não se trata de normas constitucionais? E a força normativa da Constituição? A Constituição consagra apenas promessas inconsequentes? A revolução no papel dos juízes se dá nesse contexto. Os direitos sociais também são direitos públicos subjetivos, ou seja, além de serem implantados pelo comportamento do estado, revelam-se igualmente direitos individuais, em alguma dimensão, podendo ser pedidos perante o Poder Judiciário. São direitos que permitem o exercício de outros direitos, os chamados de primeira dimensão, ligados à idéia de liberdade (art. 5º, CF). A Constituição Federal de 1988 escancarou as portas do Poder Judiciário (art. 5º, XXXV, CF), de modo que mais e mais pretensões relativas a direitos sociais chegam às mãos dos juízes. Em princípio, a decisão sobre essas políticas públicas deve caber aos que ocupam cargos eletivos, pela própria razão de ser da democracia: todo poder emana do povo que o exerce diretamente ou por meio de seus representantes (art. 1º, parágrafo único, CF). Ocorre, entretanto, que diante da inércia e alegadas limitações orçamentárias, esses serviços não são prestados a contento pelo Poder Público. É aqui que entra o juiz decidindo mandados de segurança e ações diversas versando sobre medicamentos, cirurgiais, matrícula na escola ou na creche etc. Repita-se. São assuntos que deveriam orbitar em torno das ações políticas e não no Judiciário. O ativismo judicial, expressão já criticada hoje, é exatamente a postura do juiz que concede esses direitos sociais em liminares e decisões de mérito. O juiz federal George Marmelstein Lima, dono do imperdível blog http://www.direitosfundamentais.net/, prefere o termo Aplicação Judicial dos Direitos. O que precisa ser dito é que essa é uma realidade inafastável nos dias de hoje. Nos processos judiciais, o governo usa, em regra, um argumento de ordem orçamentária, consagrado pela expressão 'reserva do possível', dizendo que não há recursos para atender ao pedido judicial, mas essa alegação não seduz os juízes, que geralmente acolhem os pleitos judicais, sob o fundamento de que um mínimo existencial de dignidade humana deve ser respeitado. O assunto vem recebendo o nome de Judicialização da Política. O perigo, alertam os especialistas, é a inversão dos papéis institucionais do estado. O juiz não pode ordinariamente decidir sobre políticas públicas. Por outro lado, Luís Roberto Barroso ensina que é impossível Direito e Política serem o tempo todo estanques, realidades absolutamente divorciadas. Aliás, até questões ligadas a Comissão Parlamentar de Inquérito e demarcação de terras indígenas o Judiciário tem julgado. E sobre os direitos sociais o STF na semana passada deu o norte para o julgamento dessas matérias (Suspensões de Tutela (STA) 175, 211 e 278; das Suspensões de Segurança 3724, 2944, 2361, 3345 e 3355; e da Suspensão de Liminar (SL) 47). A atuação do Judiciário deve ser excepcional, somente em casos em que é imprescindível a tutela jurisdicional, como, por exemplo, graves doenças terminais, não podendo decidir no sentido de mandar construir um hospital, 'furar' uma fila legítima do SUS, ou determinar tratamentos sem comprovação científica de eficácia, bem como adquirir medicamentos importados com congênere nacional possível de ser encontrado. Nesse julgamento, o ministro Gilmar Mendes deu uma aula sobre o assunto. O ministro Celso de Mello disse nessa sessão do STF que os direitos socais são impregnados de fundamentalidade, razão pela qual é legítimo exigi-los em juízo. Prudência é importante, mas respeito aos direitos fundamentais é mais ainda. É isso, embora se possa dizer muito mais.

3 comentários:

Hina disse...

Obrigada professor!
O texto ta ótimo.
É tem muito que se falar a respeito desse assunto. O professor Jhone abordou esse tema numa ótica muito interessante, a do Ronald Dworkin, ele acredita que os juízes, ao resolverem os casos difíceis, devem utilizar padrões determinados, para que a previsibilidade e justiça da resposta seja alcançada. Para isso, refuta a teoria da discricionariedade, proposta pelo positivismo jurídico, tentando encontrar algo que vincule o juiz a uma resposta correta, isso nada mais é do que o Ativismo Judicial.
A professora Fernanda também tratou desse tema, mas como um princípio das ações coletivas. Ela ressaltou que esse Ativismo pode ser sim utilizado, mas quando tratar-se de direito constitucionalmente protegido, ou seja, o juiz pode “mandar” o Estado comprar remédios, mas não construir um Chafariz, por exemplo.
Quanto ao blog do juiz federal George Marmelstein Lima, não tenho muito que falar só que é EXCELENTE. Acompanho e utilizo sempre.
A dica da “aula” do Min. Celso de Mello já foi acatada. Ta nos meus favoritos, e realmente é muito boa.
Acho que quando acabar a faculdade não vou quer saber de ativismo por um bom tempo!!!
E parabéns, seu blog ta ótimo. Adoro as piadinhas.

Fabrício Andrade disse...

Ok, Hina. É um tema muito rico mesmo, mas é importante atentar para as novas abordagens, porque tem havido um movimento forte para frear essa onda ativista. Beijo.

Fabiana disse...

Mano dei uma lida em seus textos, são de grande valor para todos nós, obrigada, tbém me deixas orgulhosa de ser sua irmã.

Te amo!